28 maio

Prefeitura prorroga pela 2ª vez prazo para entrega de laudo da estrutura do monotrilho no Sul de MG

A Prefeitura de Poços de Caldas (MG) prorrogou pela segunda vez o prazo para execução do laudo sobre as condições do monotrilho da cidade.

A nova prorrogação foi publicada no Diário Oficial do Município desta segunda-feira (27). O laudo agora deverá ser entregue até o dia 19 de julho.

O primeiro prazo venceria em 5 de abril, mas tinha sido prorrogado para o dia 20 de maio.

O laudo vai trazer um estudo técnico sobre a estrutura do monotrilho, destacando se ela pode ser reaproveitada ou demolida. Toda estrutura possui 4,3 quilômetros e levaria o monotrilho do terminal de linhas urbanas no Centro da cidade até a rodoviária.

O monotrilho

Estacionado há mais de duas décadas após a estreia, o monotrilho foi inaugurado como uma promessa de transformação da mobilidade urbana em Poços de Caldas.

Da concepção, em 1981, até os dias atuais, a iniciativa já enfrentou uma série de desafios que tem dificultado a reativação e ainda colocam em questão a viabilidade do “trem futurístico”.

Comparado com o trem da Disney, imaginado como uma pista de caminhada elevada e até sonhado como um meio de transporte turístico, o monotrilho parecia uma solução inovadora.

Os testes com passageiros começaram nos anos 2000. Após a inauguração oficial, o trem descarrilou em uma curva e 19 pessoas precisaram ser resgatadas pelo Corpo de Bombeiros.

O monotrilho funcionou poucas vezes até que foi suspenso definitivamente em 2003, quando duas pilastras, que ficam ao longo da Avenida João Pinheiro, caíram e derrubaram cerca de 50 metros da estrutura.

Um dos últimos capítulos da “novela”, antes do novo laudo, foi em 2019, quando a empresa responsável pelo projeto, J. Ferreira Ltda, abdicou do contrato de concessão do monotrilho, entregando a obra nas mãos da Prefeitura de Poços de Caldas.

Desde então, a administração municipal solicitou avaliações técnicas para entender a viabilidade e as condições da estrutura, e também tem procurado por empresas com especialidade para tocar o projeto.

27 maio

A semana mais curta será decisiva para projeto que taxa compras on-line

A Câmara dos Deputados deve votar nesta semana o projeto de lei que prevê a cobrança do Imposto de Importação para compras internacionais de até US$ 50. O dispositivo foi inserido no Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover) para atender ao pleito da indústria varejista brasileira, mas não encontra consenso entre os parlamentares nem da base nem da oposição.

Por isso, fontes próximas ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), avaliaram ao Correio que, embora a medida provisória (MP) que cria o Mover, editada em dezembro, perca a validade na próxima sexta-feira, a matéria “está na pauta há dias e sem sinal de avanço nas negociações” e não deve ser votada em uma semana esvaziada como esta.

Cumprindo a determinação de não debater matérias que cheguem por medida provisória, o Congresso impôs ao governo que a análise do tema ocorresse por meio de um projeto de lei. Mas, para não haver descontinuidade no Mover, o PL está transitando com urgência, justamente para que não haja um vácuo de regulamentação. O programa está em andamento desde dezembro e, caso a MP caduque, terá que ser suspenso.

Lira determinou, no fim da última semana, que os deputados estejam em Brasília hoje para votar a questão, com a exigência de registro biométrico no plenário. O parlamentar teria ligado para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo uma reunião presencial para tentar negociar a taxação de compras internacionais e teria, inclusive, apresentado três alternativas. A primeira permite uma única compra anual com isenção. A outra, com duas compras por ano, uma em cada semestral. A terceira seria uma taxação gradual, tal qual a desoneração da folha de pagamento.

No entanto, a reunião ficou para esta semana, apertando ainda mais o tempo de vida do texto. Com validade de 120 dias, a MP perderá o efeito e ainda precisa ser analisada no Senado até quarta-feira, tendo em vista o feriado de Corpus Christi no dia 30 de maio. O Correio apurou que o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) permaneceu em Brasília, mas que, para fazer qualquer negociação sobre assunto, aguardaria o início da semana.

Atualmente, as compras do exterior abaixo de US$ 50 estão enquadradas no programa Remessa Conforme, da Receita Federal, e são taxadas somente pelo Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é estadual, com alíquota de 17%. O Imposto de Importação, federal, de 60%, é cobrado somente em remessas que custem acima de US$ 50.

A medida é considerada impopular por parte dos deputados, que acreditam que poderia prejudicar os parlamentares no futuro, com a proximidade das eleições municipais. Por outro lado, a taxação é vista como necessária para igualar os sites estrangeiros ao varejo nacional, além de ser um instrumento de arrecadação.

Diante do impasse sobre a cobrança integral do Imposto de Importação, o relator do PL do Mover, deputado Átila Abreu (PP-PI), deve sugerir uma tributação escalonada para valores de até US$ 50. Na prática, a alternativa prevê que a alíquota suba conforme o valor da mercadoria.

Setor produtivo pressiona

Segundo o último balanço bimestral do Remessa Conforme, divulgado no início deste mês, referente aos meses de fevereiro e março, foram registradas 32,2 milhões de vendas on-line para o Brasil. O valor aduaneiro somou R$ 2,6 bilhões, rendendo arrecadação de R$ 328 milhões com o Imposto de Importação.

Entidades ligadas ao comércio e à indústria têm pressionado pela taxação das compras on-line desde o governo Bolsonaro. Mas foi a partir da criação do Remessa Conforme que a campanha se intensificou. No ano passado, quando o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou a medida, a primeira dama Janja da Silva chegou a fazer uma live no Instagram, com Haddad, para pedir para não tributar. Na semana passada, a votação da matéria foi cancelada depois de o próprio presidente Lula, perguntado por jornalistas, responder que vai vetar, caso o item seja aprovado no Congresso. No mesmo dia, mais cedo, Haddad havia defendido a “isonomia” entre a indústria nacional e a externa.

Em nota conjunta, o setor produtivo alega que tem enfrentado “uma grave concorrência desigual, com quedas de produção e perda de empregos”. “Atualmente, ao perder vendas para essas importações menos tributadas, a indústria e o comércio nacionais deixam de empregar 226 mil pessoas. A desigualdade na tributação entre a produção nacional e as importações de até US$ 50, por meio de plataformas de comércio eletrônico, destrói empregos no Brasil”, destacou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban.

As varejistas chinesas, por outro lado, alegam que o novo imposto pode encarecer as compras em cerca de 92%, chegando a dobrar o preço final dos produtos ao consumidor. “Essa é uma emenda inesperada em um texto que não guarda qualquer relação com o tema que está sendo discutido. Tentou-se argumentar que os dois falam de programas de importação, mas não dá para comparar quem importa um carro elétrico com quem compra uma calça jeans”, disse ao Correio a head de relações governamentais da Shein no Brasil, Anna Beatriz Lima.

Guerra de dados

A Shein divulgou um levantamento que aponta que a maior parte dos seus consumidores são de classes mais baixas, indicando que uma nova taxação afetaria diretamente o consumo dos mais pobres. De acordo com a varejista chinesa, o percentual de consumidores das classes C, D e E que adquirem produtos internacionais na plataforma da empresa é de 88%.

Na iminência da votação, o presidente da Câmara mencionou uma pesquisa realizada pela CNI que rebate esse cenário, afirmando que a maioria dos consumidores de sites asiáticos que seriam atingidos com o fim da isenção para compras no exterior de até US$ 50 são de classe alta. De acordo com os dados, apenas 18% da população com renda de até dois salários mínimos fizeram compras on-line internacionais de produtos com isenção de até US$ 50. Lira descarta tratar da questão em outro projeto.

26 maio

Especialistas e entidades propõem alternativas para a falta de vagas

A falta de vagas para estacionar é uma velha conhecida dos brasilienses, principalmente quando se trata de áreas comerciais, onde clientes disputam espaço com lojistas e funcionários dos estabelecimentos. Conhecida como a rua das elétricas, a comercial da 109/110 Sul tem alta rotatividade. No entanto, de acordo com Wellington Marinho, 59 anos, que trabalha em uma das lojas, a depender do horário, é bem difícil conseguir parar o carro em um dos pontos da comercial.

Ele sai de Águas Claras, onde mora, todos os dias e vai para o trabalho de carro próprio. “Um cliente geralmente demora cerca de 20 minutos na loja. Se eu chego às 8h e saio às 18h, imagina quantas clientes teriam ocupado a mesma vaga ao longo do dia”, reflete, ao revelar que tanto ele quanto os colegas são orientados a estacionar o carro na residencial, deixando as vagas em frente às lojas apenas para os fregueses. Wellington conta que opta por ir de veículo próprio para o trabalho, porque também faz o serviço de assistente técnico e tem que ir a diferentes partes do Distrito Federal.

O presidente da Associação dos Comerciantes do Distrito Federal (ACDF), Fernando Brites, relata que vagas ocupadas por lojistas e funcionários vêm sendo discutidas pela entidade há cerca de 30 anos. Ele sugere a criação de alamedas arborizadas na parte de trás dos blocos comerciais. “Seria onde os trabalhadores do comércio poderiam estacionar, além de ampliar a quantidade de vagas apropriadas para estacionamento”, argumenta.

Pouco espaço

Em Águas Claras, o gerente de uma lanchonete na Rua das Pitangueiras, Marcos Pereira, 64, diz que prefere estacionar em uma das vagas em frente ao estabelecimento onde trabalha. “Eu coloco o meu carro aqui e deixo o dia todo no local por conta da segurança. Marcos chega à lanchonete diariamente às 5h30. Ele afirma que achar uma vaga para estacionar na cidade é complicado. “Um prédio de garagem seria uma boa solução”, pondera.

A servidora pública Luana Queiroz, 42, reclama que a maioria dos comércios de Águas Claras não tem área de estacionamento próximo, o que leva os clientes a pararem longe do destino. “Tem que ter um planejamento prévio antes de levantar novas construções para que já haja reservado um espaço para o estacionamento. Aqui, muita gente acaba estacionando em locais inapropriados por falta de vaga”, acrescenta.

Soluções

O professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de Brasília (UnB) Frederico Flósculo defende a criação de edifícios garagem e de estacionamentos subterrâneos. “A ocupação do subsolo é importante para a otimização da ocupação do solo urbano”, assinala. Sobre a criação das alamedas na parte de trás das comerciais do Plano Piloto, Flósculo é categórico: “Seria uma perda de área verde nas superquadras, além de ferir o Plano Urbanístico de Brasília”.

A doutora em transportes pela UnB Adriana Modesto avalia que a solução do problema passa pelo investimento significativo em transporte público coletivo de Brasília. Ela destaca que a criação de mais estacionamentos públicos gratuitos acabam por fomentar a opção pelo uso dos automóveis. “A solução passa pelo respeito às vagas preferenciais, pelo uso racional e sustentável dos espaços públicos, pelo investimento em modos e modais coletivos, tornando-os mais atrativos e estimulando a migração do transporte individual motorizado para as referidas alternativas. Outras alternativas seriam os modos ativos (caminhadas e uso de bicicleta). Esses evitariam o transtorno diante da carência de estacionamento e ainda contribuiriam para a saúde”, defende.

O presidente do Sistema Fecomércio-DF, José Aparecido Freire, conta que a entidade vem debatendo o assunto há vários anos. “A Fecomércio defende que a melhor solução para o problema é o gerenciamento de sistema de estacionamento rotativo pago de veículo — mesma medida implantada nas principais capitais do Brasil. Lembramos que Brasília é a única metrópole brasileira que ainda não possui um sistema de estacionamento pago para administrar o fluxo de veículos em grandes centros. Dessa forma, a federação apoia o projeto Zona Verde, de autoria do GDF, que tem entre seus objetivos aumentar a rotatividade de vagas públicas”, declara.

O projeto Zona Verde, que está sendo desenvolvido no âmbito da Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), prevê a gestão de aproximadamente 115 mil vagas de estacionamento, em sistema rotativo, e a previsão de criação de aproximadamente 6 mil novas vagas em diversos pontos do DF. Uma das propostas do projeto é a criação de bolsões de estacionamento próximos de estações do metrô e terminais do BRT, com gratuidade de estacionamento para quem utilizar o transporte público em seus deslocamentos, o que deverá contribuir para desafogar o trânsito e reduzir o impacto nos estacionamentos do Plano Piloto. A proposta está em análise no Tribunal de Contas do DF (TCDF). A pasta ainda esclarece que o GDF desenvolve políticas públicas de incentivo ao uso do transporte público coletivo e da mobilidade ativa.

25 maio

Em busca da mobilidade verde, cidades investem em ônibus elétricos

O cumprimento das metas de descarbonização dos países passa também pelo esforço das cidades, algumas delas com metas próprias de redução de emissões. Faz parte desses esforços a busca de uma mobilidade urbana mais verde, o que inclui iniciativas de eletrificação da frota. Em algumas capitais do Brasil, a ambição inclui uma frota 100% sustentável já em 2050, embora ainda sejam poucos os municípios com planos concretos de descarbonização. Agora, o segmento se prepara para uma nova fase de estímulo com o programa Mover, que, embora ainda dependa do aval do Congresso, pretende estimular a produção de veículos movidos à eletricidade com a criação de diversos incentivos financeiros e de linhas de financiamento.

O primeiro passo ocorreu recentemente com o anúncio do BNDES de que financiará, com recursos do Fundo Clima e do FAT, a renovação da frota de ônibus em municípios brasileiros. Ao todo, serão investidos R$ 4,5 bilhões para aquisição de 1.034 ônibus elétricos e 1.149 ônibus Euro 6, tecnologia que permite menor volume de emissão. Até agora, já foram selecionados projetos em oito municípios de 5 estados. Por se tratar de projetos novos que ainda serão analisados pelo banco, e por conta das eleições municipais, os desembolsos devem começar no fim deste ano e serão concentrados em 2025. A transição energética e a busca por recursos para reduzir o aquecimento global são algumas das prioridades do Brasil durante sua presidência do G20.

Segundo Luciana Costa, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do BNDES, as cidades têm se esforçado para adotar ônibus elétricos em sua matriz, mas lembra que há uma série de desafios para o crescimento de uma matriz de transporte mais limpa nos próximos anos. Ela cita aspectos relacionados ao dimensionamento da infraestrutura de recarga para baterias, rede elétrica e limitações de autonomia em itinerários longos. Cita ainda as questões financeiras:

— Os ônibus elétricos são 3,5 vezes mais caros que os movidos a diesel. Há ausência do valor de revenda, além de requisitos envolvendo a governança e saúde financeira para operadores e municípios. Assim, as cidades têm um grande desafio, mas, além do impacto climático, investir em transporte coletivo gera benefícios adicionais relacionados a aspectos sociais, econômicos e ambientais — diz Luciana.

No Rio, VLT já é 100% elétrico

Entre as cidades, começam a emergir projetos em diferentes frentes. No Rio de Janeiro, onde o VLT (sistema de Veículo Leve Sobre Trilhos) já é 100% elétrico, mais da metade dos novos ônibus adquiridos recentemente para o BRT contam baixa redução de emissão de gases poluentes. Em abril, a prefeitura lançou um edital para transporte aquaviário 100% elétrico entre os aeroportos do Galeão e Santos Dumont, em um projeto que vai consumir R$ 106 milhões. Em paralelo, a Prefeitura do Rio é a primeira cidade da América Latina a utilizar fontes limpas e renováveis no mercado livre de energia, para abastecer os prédios da administração municipal. Em nota, a prefeitura disse que as ações fazem parte do Plano de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática da Cidade do Rio para se adequar as metas do Acordo de Paris.

Outras cidades também vem acelerando seus projetos com o apoio de financiamento no BNDES. Para José Luis Gordon, diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do BNDES, a eletrificação das frotas de ônibus elétricos é um dos temas prioritários do banco:

— Em 2023, foi aprovada operação de R$ 2,5 bilhões para o município de São Paulo viabilizando que os novos ônibus comprados pelos operadores da concessão sejam veículos elétricos. Há outras ações em andamento, como o financiamento ao primeiro BRT elétrico do Brasil, na região do ABC paulista, além de estudos para inserção de ônibus elétricos nas cidades de Curitiba e Salvador, realizados em parceria com o banco alemão de desenvolvimento KfW, e a estruturação da nova concessão de ônibus da Rede Integrada de Transporte de Curitiba com vistas à eletromobilidade — exemplifica Gordon.

Assim, a cidade de São Paulo já obteve um total de R$ 6 bilhões para viabilizar a aquisição de ônibus elétricos para a modernização da frota em operações de crédito com o Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco do Brasil, Caixa, além do BNDES. Segundo a prefeitura, a meta de substituição da frota de ônibus da cidade por modelos movidos a energia limpa é de 20% até o fim de 2024. Hoje, dos 12.019 veículos em operação na maior capital do país, 380 veículos são elétricos, dos quais 179 são movidos à bateria e 201 são bondinhos, que contam com dois cabos na parte superior que fornecem energia elétrica. “Os ônibus estão sendo entregues de acordo com a capacidade produtiva dos fabricantes envolvidos na construção de um ônibus elétrico, que envolve chassis, carroceria, baterias e outros elementos”, disse a prefeitura em nota.

Curitiba: 54 ônibus elétricos nas ruas até agosto

Já em Curitiba os primeiros ônibus elétricos começam a circular até agosto deste ano. Nessa primeira aquisição serão 54 veículos, que fazem parte do projeto de eletromobilidade do transporte público da cidade e contam com R$ 380 milhões em investimentos. Segundo Ogeny Pedro Maia Neto, presidente da Urbanização de Curitiba (Urbs), que gerencia do transporte coletivo na capital, o novo modelo de concessão vai contemplar, já na sua origem, a prioridade de redução de emissão de gases do efeito estufa com mudança na matriz energética, o que traz também segurança jurídica. Destaca ainda que os primeiros ônibus elétricos serão carregados nas garagens das empresas de ônibus, mas em uma segunda etapa será criada uma rede de recarga tanto nas garagens como o desenvolvimento de estruturas em pontos estratégicos da cidade.

— A compra dos primeiros ônibus elétricos está alinhada ao compromisso de Curitiba em se tornar neutra em emissões e resiliente aos riscos climáticos até 2050. A meta é que até 2030, 33% da frota de ônibus da capital seja zero emissões, percentual que deve alcançar 100% até 2050. A eletrificação da frota das cidades é um passo importante para tornar as cidades mais sustentáveis. Em 2023, iniciamos os primeiros testes com a tecnologia. Até agora, já foram testados sete veículos elétricos da Eletra, Volvo, Marcopolo e BYD. Até o fim do semestre, devem entrar em teste Volkswagen e Ankai e, no segundo semestre, Mercedes Benz e Higer. O edital de chamamento para testes de ônibus elétricos foi prorrogado até março de 2026 — afirma Neto.

24 maio

Corredores verdes e cidades-esponja, as soluções que vêm da natureza

A adaptação é azul e verde. Dar às cidades resiliência contra desastres climáticos tão diferentes quanto inundações, deslizamentos e ondas de calor é complexo e envolve uma série de medidas. Porém, uma das que têm se mostrado mais eficientes no mundo é aumentar o verde e o azul urbanos, dizem especialistas.

O retrofit baseado na natureza, ou infraestrutura azul e verde produz, por exemplo, cidades-esponja, que absorvem excesso de água da chuva. Em vez de aprisionar rios em canais de margens concretadas, os libertam e ampliam seus leitos, devolvidos ao tamanho original. Parques com áreas inundáveis e cobertas com a vegetação que favorece a absorção de água ocupam as margens.

Também são frutos da mesma concepção corredores verdes, que conectam ruas, praças, parques arborizados para reduzir o calor e a poluição do ar e sonora, além de amortecer o impacto de chuvas fortes. O solo dessas áreas, poroso, absorve água com mais eficiência, diminuindo o risco de enchentes.

Estudos em Portland (EUA), Leeds e Newcastle (ambas no Reino Unido) mostraram que a recuperação das planícies de inundação de rios e a transformação dessas áreas em parques reduz o risco de inundações.

— Não adianta investir apenas em soluções convencionais de engenharia, acabamos de ver todas elas indo por água abaixo no Rio Grande do Sul. Tudo tem que ser revisto em conjunto com soluções baseadas na natureza — frisa Denise Duarte, professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Universidade de São Paulo (FAU/USP) e coordenadora do projeto “Adaptação das cidades à mudança do clima na microescala”.

Ponto de ônibus sem metal

Ela coordenou um estudo sobre planos de adaptação climáticas no mundo e diz que cada lugar desenvolveu sua estratégia. A vertical Hong Kong, por exemplo, tenta criar espaços públicos com vegetação em cada cantinho disponível, incluindo partes comuns de edifícios. Já Sydney redesenhou espaços públicos e criou parques.

Denise diz que o município de São Paulo, por exemplo, tem um plano climático vasto. Mas é preciso transformar estações de trem, rodoviárias e pontos de ônibus em “oásis urbanos”. Nos pontos de ônibus adaptados ao calor, deve haver sombra de qualidade (sem materiais que acumulam calor, como metais e vidro) e água potável. Outra medida é sombrear mais as ciclovias para que possam ser usadas mesmo em dias quentes.

Toda árvore urbana faz diferença. Estudo da Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos EUA revela que a temperatura sob uma árvore é em média 5º C menor que a medida em área aberta contígua. Num dia quente, um carro estacionado à sombra de uma árvore pode ficar até 25º C mais fresco do que outro exposto ao sol. Isso acontece porque apenas cerca de 30% da radiação solar chega à área sob uma árvore. O restante é absorvido pelas folhas para a fotossíntese e uma parte é refletida de volta à atmosfera.

Porém, as árvores também são uma medida de desigualdade. No Brasil e no mundo, as áreas mais ricas são as mais arborizadas. Isso é evidente em cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. E também em nível regional.

O Norte é milionário em áreas naturais, pois tem a Amazônia. Mas paradoxalmente tem as cidades menos arborizadas do país, algumas não chegam a 1% de arborização de vias e parques públicos.

A diretora do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), Regina Alvalá, cita Barcelona como cidade que conseguiu melhorar a mobilidade, reduzir o uso de veículos movidos a combustíveis fósseis e aumentar significativamente os espaços verdes.

— Barcelona priorizou o pedestre e não o carro. É bem arborizada, tem muitas ruas somente para pedestres, espaços para descanso, fontes e tem adotado prédios híbridos, comerciais e residenciais, o que melhora a mobilidade.

Educação climática

Acossadas pelas mudanças climáticas e pelos extremos que em 2023 e 2024 bateram todos os recordes, as cidades buscam se adaptar e também mitigar suas emissões. O mais recente e completo estudo sobre o assunto foi publicado em abril na revista científica BMC Public Health, do grupo Nature, que analisou outras 6.104 pesquisas. Nele, os autores ressaltaram a educação climática como uma poderosa ferramenta.

O climatologista José Marengo, uma das maiores autoridades em mudança climática do mundo e líder do relatório da Organização Mundial de Meteorologia (OMM) sobre o clima da América do Sul, concorda:

— Adaptação urbana não se resume a obras. Aprende-se na escola e se ensina para todas as esferas da sociedade. É preciso letramento climático para todos.

23 maio

Lula diz que deve vetar taxa em compras online, mas pode negociar

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou nesta quinta-feira (23/5) que”a tendência é vetar” a taxação de compras importadas de até US$ 50, em discussão no Congresso Nacional.

O petista afirmou, porém, que também pode negociar a medida. Questionado se deve conversar sobre o tema com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o petista respondeu que ainda não tem encontro marcado, mas que está disponível para a conversa.

Lula falou brevemente com jornalistas no Palácio do Planalto na manhã desta quinta-feira (23/5) ao esperar a chegada do presidente do Benim, Patrice Talon, com quem se reúne hoje.“Não tenho encontro previsto, mas se ele [Lira] quiser conversar eu, depois do presidente do Benim, estou à disposição”, disse Lula.

“A tendência é vetar [a taxação]. Mas a tendência também pode ser negociar”, sinalizou ainda.

A taxação das compras de até US$ 50 foi incluída como um “jabuti” no Projeto de Lei que regulamenta o Programa Mobilidade Verde (Mover), em discussão na Câmara dos Deputados.

A taxação causa divergência tanto na base governista quanto na oposição por sua impopularidade, apesar de representar um aumento na arrecadação federal. Lula, porém, orientou seus aliados a votar contra a medida ontem (22). “Quem é que compra essas coisas? São mulheres, em sua maioria, jovens, e tem muita bugiganga. Eu nem sei se essas bugigangas competem com o mercado brasileiro. O que nós precisamos é tentar ver um jeito de não tentar ajudar um prejudicando o outro”, disse ainda o presidente Lula.

22 maio

Haddad se esquiva sobre fim de isenção até US$ 50: “Não é proposta do governo”

A cobrança do imposto de importação sobre remessas do exterior de até US$ 50 segue sendo alvo de embates no Congresso Nacional. O tema foi incluído em emenda no projeto que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que pode ser votado ainda nesta quarta-feira (22/5) pela Câmara dos Deputados.

Em audiência pública na  Comissão de Finanças e Tributação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reconheceu as queixas da indústria nacional e demonstrou preocupação com o tema. “Há muita preocupação, evidentemente, há preocupação com opinião pública, preocupação com os empregos do comércio local. E na minha opinião pessoal venda é venda, seja local ou internacional. Ela tem que ser isonômica, é o meu entendimento”, disse.

O ministro afirmou que o Legislativo tem toda a legitimidade de disciplinar sobre o tema e defendeu um entendimento entre os Três Poderes para resolver a situação. Segundo interlocutores, o tema é alvo de divisão interna até mesmo no Executivo, e o chefe da equipe econômica teria se sentido aliviado pela decisão sair de sua alçada.

Bate-boca

Ao fim da audiência, o tema foi motivo de bate-boca entre o ministro e os deputados Kim Kataguiri (União Brasil-SP) e Bia Kicis (PL-DF), que o questionaram sobre a retomada do imposto. Haddad se limitou a dizer que “essa não é uma proposta do governo”.

O ministro defendeu ainda a alíquota de 17% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) cobrada pelos estados para as importações abaixo de US$ 50, instituída por meio do programa Remessa Conforme, e disse que não acredita que a questão será resolvida no PL do Mover.

Na véspera, Haddad já havia afirmado que a taxação de compras internacionais on-line não integra as medidas do governo para compensar a desoneração da folha de pagamento. Segundo ele, a medida não arrecadaria o suficiente para compensar o impacto do benefício, estimado em R$ 7,2 bilhões em 2024.

Entidades ligadas ao comércio e à indústria têm pressionado o governo para taxar as compras on-line desde o ano passado. De acordo com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a manutenção da isenção provoca perda de empregos e prejuízo à indústria nacional. As varejistas, por outro lado, alegam que uma tributação sobre as remessas internacionais tendem a prejudicar as classes C, D e E, que representam 90% dos compradores.

20 maio

‘Fiz uma descoberta importante sobre o vírus que matou meu pai’

Os cientistas costumam usar termos técnicos, descritivos e impessoais para explicar um determinado trabalho que acabaram de publicar. Mas a brasileira Marcella Cardoso classifica o seu artigo acadêmico mais recente como uma “carta de amor”.

A pesquisa à qual ela se refere foi realizada na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e divulgada pela Cell, uma das revistas acadêmicas mais prestigiadas do mundo.

O trabalho permitiu desvendar um importante mecanismo por trás dos casos graves de covid-19 e abre alas para novos tratamentos contra doenças virais no futuro.

A infecção pelo coronavírus, aliás, foi a doença que matou o pai dela — para quem é endereçada a tal carta de amor.

A perda precoce motivou uma verdadeira virada de chave na carreira da pesquisadora — que foi diretamente influenciada por uma série de eventos globais, profissionais e pessoais.

Mas, para entender como a cientista chegou até aqui, é preciso dar alguns passos para trás e entender de onde ela veio.

A educação liberta

Nascida e criada no interior paulista, Cardoso precisou lidar com exigências e altas expectativas desde a infância.

A mãe dela, Regina Cardoso, era professora da rede pública e privada — e, com seis anos, a menina foi matriculada numa escola particular, onde tinha uma bolsa de estudos oferecida aos filhos de funcionários da instituição.

“Essa bolsa sempre esteve atrelada ao meu desempenho escolar, então eu precisava tirar boas notas e aprendi cedo a ser muito aplicada nos estudos”, diz.

Ela se lembra da disparidade econômica entre a família dela e dos colegas de classe. “Para minha mãe conseguir sustento, ela trabalhava três turnos, manhã, tarde e noite. Nossa casa era extremamente simples.”

Cardoso lembra de uma frase que a mãe disse à época. “Ela me falou: ‘Marcela, o estudo é a maneira de você mudar a realidade e ter um futuro”. Essa ideia me acompanha até hoje.”

Na adolescência, após alguns vestibulares frustrados, ela finalmente foi aprovada no curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), também no interior de São Paulo.

“Nos últimos anos de faculdade, em meados de 2011, fiz uma iniciação científica e realmente me apaixonei pela área de pesquisa”, destaca ela.

A iniciação científica mencionada pela especialista é um projeto feito por alunos do Ensino Médio ou da graduação universitária, com a orientação de professores. O objetivo aqui é estimular a produção do conhecimento nas primeiras etapas da formação intelectual e acadêmica.

Com o diploma em mãos, Cardoso foi direto para o mestrado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde se especializou em saúde materna.

Com mais essa etapa concluída, ela seguiu para o doutorado na mesma Unicamp, onde mergulhou no campo da oncologia ginecológica e mamária.

“O doutorado foi um divisor de águas. Tive a primeira oportunidade de fazer um estágio fora do país em Barcelona, na Espanha”, conta ela.

Em 2019, quando estava prestes a completar o doutorado, Cardoso ficou sabendo de uma oportunidade pela qual ansiava há tempos: a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao Governo Federal, havia aberto um edital de mobilidade internacional, para alunos que desejavam estudar fora.

“Eu tinha que jogar para ganhar. Então, antes mesmo de fazer a inscrição no edital, eu entrei em contato com um grupo de pesquisa da Escola de Medicina de Harvard, fiz uma série de entrevistas e fui selecionada para uma vaga.”

“Com isso, me candidatei à bolsa da Capes com essa carta na manga e acabei aprovada.”

Cardoso chegou aos Estados Unidos no finalzinho de janeiro de 2020 e viveu quase um mês de normalidade — até que março chegou e trouxe junto a pandemia de covid-19.

“Eu trabalhei de casa por algum tempo, mas minhas pesquisas eram realizadas no Massachusetts General Hospital, que está entre os maiores centros médicos dos EUA. Então logo voltamos ao presencial”, diz ela.

Em fevereiro de 2021, passado quase um ano desde que o coronavírus se espalhou pelo mundo, a cientista recebeu uma notícia decisiva. “Meu pai me ligou para dizer que tinha testado positivo para covid.”

Salto de fé 1

Após a fatídica ligação, Cardoso começou a bolar um plano. “Eu já tinha tomado a primeira dose da vacina e recebi o treinamento sobre como lidar com pacientes com covid-19”, resume.

Ela pensou que, ao tomar a segunda dose, poderia retornar ao Brasil para ficar perto do pai, o corretor de imóveis Luiz Carlos Cardoso.

Mas a decisão de voltar ao país significava uma encruzilhada para a cientista. “O Brasil vivia uma das piores ondas da pandemia e o consulado dos Estados Unidos estava completamente fechado”, diz.

“Se eu fosse ao Brasil, não existia qualquer garantia de que conseguiria voltar para os EUA e terminar o meu doutorado aqui.”

Para ela, tomar uma decisão desse tamanho foi algo muito cruel. “Tive que dar esse salto de fé. Eu precisava ver meu pai… Na verdade, algo já dizia dentro de mim que seria uma despedida e eu precisava ao menos dar um enterro digno a ele.”

Enquanto planejava o retorno, Cardoso tentava acompanhar a saúde do pai à distância.

Nesse meio tempo, Luiz Carlos teve uma piora do quadro e precisou ser internado numa Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital público localizado em Campinas.

“É torturante lidar com o silêncio. Fiquei sem notícias do meu pai durante quase 48 horas.”

A cientista descobriu o telefone da UTI do hospital e, após diversas tentativas frustradas de ligação, alguém atendeu do outro lado. “Eu me lembro da adrenalina que senti. Pedi informação e a pessoa me respondeu que não estava autorizada a falar.”

“Eu estava de joelhos e implorei para que ela apenas me dissesse se meu pai estava vivo.”

De volta ao Brasil, a única coisa que Cardoso conseguiu fazer foi uma reunião com a médica responsável pela UTI onde o pai estava. Mesmo vacinada e com treinamento, ela não foi autorizada a visitá-lo.

“Eu queria muito ver meu pai, para poder me despedir dele.”

No dia 14 de março de 2021, Luiz Carlos morreu de covid.

“Ele faleceu por volta do meio dia, mas só recebemos a ligação para irmos ao hospital no final da noite. Quando me informaram da morte, pediram que eu reconhecesse o corpo dele.”

“Quer dizer, eu não podia me despedir do meu pai pelo risco do contato com alguém infectado, mas agora que ele morreu tudo bem eu ir lá?”

“Isso mostra como a situação estava dramática no Brasil. Não culpo a equipe do hospital, porque sei que eles estavam fazendo o melhor possível diante das condições.”

Cardoso diz que a penúria se prolongou por dias. “Após a morte, tive que ligar para as pessoas e pedir para que elas não fossem no velório.”

“Minha mãe mesmo ficou em casa. Imagina, você perder a pessoa que mais ama e não poder nem se consolar com amigos e familiares…Eu mesma não pude abraçar minha mãe naquele momento.”

“Foi tudo muito dramático. Meu pai morreu sem ter ao menos a oportunidade de tomar a vacina”, complementa ela.

Salto de fé 2

“Meu pai faleceu em março de 2021. Mas, como o mundo não para, precisei recolher os pedaços do meu coração, porque no mês seguinte eu tinha que fazer o exame de qualificação para o doutorado”, continua Cardoso.

O tal exame de qualificação é uma das etapas mais importantes da formação. Ela ocorre antes de o aluno fazer a defesa da tese, em que reúne todas as informações daquilo que pesquisou até aquele momento e, caso seja aprovado, ganha o título de doutor.

E, para fechar essa etapa da carreira acadêmica, a cientista precisava voltar a Harvard.

“Mas as embaixadas e os consulados americanos estavam fechados. Descobri que, naquele momento, só existiam três exceções em que se permitia a alguém entrar nos EUA: se você estivesse fazendo um tratamento médico, se tivesse um filho no país ou se era pesquisador e estivesse trabalhando em temas relacionados à saúde, ou mais especificamente à covid.”

Como se encaixava no terceiro grupo, a brasileira pediu que os colegas da universidade fizessem uma carta para solicitar o retorno dela às terras americanas.

Quatro meses depois, em meados de julho de 2021, ela tinha toda a papelada em mãos e obteve a autorização para regressar.

De volta à bancada do laboratório, Cardoso enfrentou novas dificuldades. “A bolsa que eu ganhava da Capes acabou e tive que dar um novo salto de fé. Precisei morar de favor durante alguns meses, porque Boston é uma cidade muito cara.”

Nesse período, ela também sofreu um acidente grave. “Eu estava vestida com uma camisa larga, de material sintético, que por acaso me lembrava muito o meu pai.”

“Me aproximei de um balcão, onde havia acendido uma vela aromática.”

“Em questão de segundos, a camisa estava em chamas. Tive queimaduras de segundo e terceiro grau”, diz ela.

Cardoso diz que sentiu muita dor, mas não conseguia chorar. “Não sou uma pessoa que tem aquela positividade tóxica. Mas, naquele momento, lembro de ter pensado: ‘Marcela, você acabou de enterrar o seu pai. Nada pode ser pior do que isso’.”

Recuperada do acidente, Cardoso finalmente defendeu o doutorado em setembro de 2021 — e já havia engatilhado um pós-doutorado na sequência.

Em outubro, ela começou a nova etapa da carreira acadêmica no Instituto Ragon, um centro de referência em imunologia, mantido por Harvard, Massachusetts Institute of Technology (MIT) e Massachusetts General Hospital.

“A priori, fui contratada para fazer estudos sobre imunoterapia e câncer de mama.”

“Mas estávamos no meio da pandemia e, com uma certa audácia, perguntei se eles deixariam que eu liderasse uma linha de pesquisas sobre a covid-19. E eles disseram que sim.”

‘Minha pesquisa composta por sangue latino’

O trabalho encabeçado por Cardoso tinha como objetivo principal responder uma questão: por que algumas pessoas, mesmo jovens e saudáveis, sem nenhuma comorbidade, desenvolvem a forma grave da covid-19 e precisam ser internadas e intubadas?

“O que acontece que o sistema imunológico desses indivíduos não consegue contra-atacar a infecção?”, questiona ela.

A curiosidade, aliás, tem a ver com a história do próprio pai dela que, apesar de estar com 67 anos, não possuía nenhuma condição de saúde mais preocupante.

“Quando meu pai morreu, eu criei um compromisso comigo mesmo de, a partir da minha bagagem acadêmica, usar minha inteligência, criatividade e senso crítico para fazer algo significativo sobre a covid”, relata.

Outro cuidado de Cardoso foi trazer o Brasil para a pesquisa. Ela estabeleceu uma parceria com especialistas do Hospital de Clínicas da Unicamp, que enviaram amostras de sangue colhidas de pacientes que desenvolveram a covid grave.

Esse material foi usado para observar em detalhes como as células se comportam diante de um ataque viral.

“Geralmente, as pesquisas relacionadas ao Brasil carregam o estigma da escassez e das doenças típicas do terceiro mundo. Mas gostaria que nosso país pudesse ser olhado sob outro prisma.”

“Eu queria que a minha pesquisa fosse composta por sangue latino”, brinca ela.

Como Cardoso tinha acesso a um laboratório com altíssimo nível de biossegurança, ela podia trabalhar diretamente com o coronavírus em carne e osso (ou proteínas e ácidos nucleicos, para ser mais exato). “Nós nos vestimos com roupas especiais, parecíamos astronautas”, caracteriza a cientista.

O trabalho consistia basicamente em testar uma a uma as dezenas de proteínas do coronavírus, para ver se alguma estava relacionada à gravidade da infecção.

Foi aí que a pesquisadora brasileira encontrou a ORF6, uma proteína produzida pelo genoma do Sars-CoV-2 (o patógeno causador da covid).

E aqui vale uma breve aula de biologia. Quando uma célula do nosso corpo está doente — foi infectada por um vírus, por exemplo — ela “ganha” receptores na superfície chamados MIC-A e MIC-B.

Esses tais receptores servem como uma pista para que células do sistema imunológico conhecidas como NK (sigla em inglês para natural killers, algo como ‘assassinos naturais’) entrem em ação.

Como o próprio nome sugere, as NK matam as células doentes para evitar que o problema cresça, se agrave ou se espalhe.

“É como se as células NK fossem os guardiões do nosso corpo, patrulhando constantemente para detectar e destruir qualquer célula que tenha sido comprometida por um vírus”, explica Cardoso.

Mas o coronavírus encontrou uma maneira de “driblar” essa camada de proteção do nosso corpo. Aquela proteína ORF6 fabricada pelo patógeno inibe os receptores MIC-A e MIC-B que deveriam aparecer nas células doentes.

Sem esse sinal, as células NK não detectam o perigo — e o coronavírus fica quietinho dentro da célula, usando todo o maquinário biológico para criar novas cópias de si mesmo, que vão repetir esse processo em outras partes do organismo.

E esse fenômeno, conhecido no meio científico como evasão imune, acontece de forma mais pronunciada justamente nos pacientes com covid grave.

“Foi um trabalho muito exaustivo”, admite a cientista.

“Tivemos que comprovar esse mecanismo de diferentes maneiras, para ter certeza que ele de fato está envolvido com a gravidade da infecção.”

Mas a pesquisa feita por Cardoso foi além: o time de especialistas decidiu avaliar se um remédio experimental chamado 7C6, da classe dos anticorpos monoclonais, poderia servir de proteção para esses indivíduos.

“Esse anticorpo se liga ao MIC-A e MIC-B da célula e serve como uma espécie de escudo. Com isso, a proteína ORF6 do coronavírus não consegue varrer esses receptores”, explica ela.

Daí, com os tais receptores ativados, as células NK podem fazer o trabalho de eliminar as unidades doentes antes que o agente infeccioso cause um estrago muito grande.

Carta de amor

Na prática, esses resultados obtidos no experimento abrem a possibilidade de novos tratamentos contra a covid e contra outras doenças infecciosas no futuro.

“Atualmente, estamos fazendo testes pré-clínicos, com camundongos geneticamente modificados, que são um modelo mais próximo do ser humano”, conta ela.

Segundo Cardoso, pesquisas como a dela constroem uma espécie de alicerce para entender melhor outras infecções virais no futuro.

“Imagina tudo o que tivemos que construir e aprender a ferro e fogo durante a pandemia de covid-19”, reflete.

“Quando vier a próxima pandemia, e é só uma questão de tempo para termos outra, conhecer a ORF6 pode ser determinante para termos um prognóstico diferente.”

A brasileira também se incomoda com o fato de olharmos a covid-19 como algo que ficou no passado.

“A doença ainda afeta pessoas hoje e precisamos continuar a dar a importância devida a ela.”

Os resultados da pesquisa, que detalha o papel da ORF6 e o potencial terapêutico da molécula 7C6, foram publicadas no final de abril na Cell, uma publicação acadêmica que está entre as mais prestigiadas no ramo das ciências biológicas, ao lado de Science e Nature.

O artigo contou com a supervisão dos pesquisadores Wilfredo F. Garcia-Beltran e Julie Boucau e teve a contribuição do aluno de mestrado Jordan Hartmann, que divide a autoria da publicação com Cardoso.

“Para você ter ideia do rigor desse processo, nós submetemos o artigo para publicação em 25 de julho de 2023 e ele foi oficialmente aceito apenas em março de 2024”, informa a cientista.

A coincidência de datas, aliás, não passou despercebida por ela.

“O aceite da publicação do estudo veio exatamente três anos depois que meu pai morreu.”

Mais do que apenas uma descoberta técnica e científica, Cardoso classifica o trabalho como uma espécie de homenagem.

“Esse artigo é uma carta de amor que escrevi para meu pai”, conclui ela.

17 maio

Governo confirma fim do pagamento em dinheiro nos ônibus a partir de julho

O secretário de Transporte e Mobilidade (Semob), Zeno Gonçalves, confirmou, na tarde de quinta-feira (16/5), que o pagamento de tarifas dentro dos ônibus do DF deve ser 100% eletrônico até o fim do ano, conforme já havia sido adiantado ao Correio. De acordo com o chefe da pasta, em entrevista coletiva, a partir de 1º de julho, algumas linhas passarão a aceitar somente os cartões Mobilidade e Vale-transporte, crédito e débito, além de QR Code (via Pix).

“Vamos começar com as linhas em que o pagamento em espécie tem o menor percentual. Elas serão divulgadas próximo à data de implantação da medida. Os usuários terão, nas paradas, terminais e nos próprios veículos, a identificação de quais sofreram a alteração”, ressaltou. “A partir do monitoramento da aceitação, por parte do público, iremos ampliando para as demais linhas. A nossa meta é, até o fim do ano, 100% das linhas aderindo ao novo sistema”, avaliou o secretário.

De acordo com Zeno Gonçalves, a intenção é agilizar e melhorar o serviço prestado ao cidadão. “Quando o usuário consegue entrar no coletivo de forma rápida, sem precisar de troco, traz um impacto enorme na viagem, pois a gente ganha no número de trajetos realizados, ampliamos as ofertas, além de darmos mais rapidez no atendimento ao usuário”, explicou.

Um dos questionamentos em relação às mudanças é quanto ao futuro dos cobradores. Procurado pela reportagem, o presidente do Sindicato dos Rodoviários, João Jesus, afirmou que é contrário ao novo sistema. “Vamos defender sempre os postos de trabalho dos cobradores. São 5,3 mil mães e pais de família que dependem desse emprego para garantir o sustento”, comentou.

Segundo o presidente, durante uma audiência pública, em 2 de maio, o secretário não comentou sobre qualquer retirada dos cobradores. “Caso a situação mude, o sindicato vai ‘resistir’. Vamos deixar nossa posição bem clara”, alertou João Jesus, indicando uma possível greve, caso haja algum indicativo de retirada dos cobradores.

Durante a coletiva, Zeno Gonçalves disse que, em princípio, os cobradores continuarão dentro dos ônibus. “Não estamos tratando sobre diminuição dos postos de trabalho. Foi uma determinação do próprio governador Ibaneis Rocha (MDB)”, reforçou. “O cobrador continuará dentro dos ônibus durante essa transição e, no momento em que a linha não tiver necessidade de comercialização, ele passa atuar juntos aos terminais e postos de recarga”, acrescentou.

Monitoramento

O gestor também comentou sobre possíveis problemas na hora da realização dos pagamentos. Segundo ele, o passageiro não vai deixar de fazer a viagem, caso isso aconteça. “Tivemos uma reunião com as áreas de tecnologia das operadoras e fizemos testes de estresse de sistema, em que os resultados de conectividade ficaram acima dos 99%”, observou. “Isso foi monitorado ao longo de meses, justamente para chegar neste momento de maturidade, implantando o sistema dentro de uma margem mínima de problemas de conexão”, afirmou o secretário.

A segurança foi outro ponto citado durante a coletiva no Buriti. A coronel Cintia Queiroz, subsecretária de Operações Integradas da Secretaria de Segurança Pública (SSP), falou que a notícia da mudança na forma de pagamento nos ônibus foi recebida com “muita felicidade” pelo secretário da pasta, Sandro Avelar. “Não trabalhamos sozinhos, precisamos da integração com outros órgãos do governo e essa medida vai, realmente, nos ajudar muito a tentar diminuir, ainda mais, os índices de criminalidade nos ônibus”, afirmou a subsecretária.

Preocupação

Presidente da Comissão de Transporte de Mobilidade Urbana (CTMU) da Câmara Legislativa (CLDF), o deputado Max Maciel (PSol) disse ao Correio que está acompanhando a situação. “Enviamos à Semob uma indicação, sugerindo a disponibilização massiva de pontos de recarga e emissão do cartão Mobilidade”, afirmou. “Também iremos enviar um ofício solicitando informações sobre o cronograma de implantação do V6 por parte das concessionárias (assim como a sua homologação e treinamentos necessários), ações de comunicação para a população sobre o tema (para evitar que a população seja pega de surpresa e tenha o direito de uso ao transporte público afetado) e se há previsão de reforço nas equipes e horários de atendimento do BRB Mobilidade”, detalhou o distrital.

De acordo com o parlamentar, a preocupação da comissão é que o usuário seja impedido de acessar o sistema. “Entendemos que não será o fim do pagamento em dinheiro no sistema de transporte público do DF, a gente só não vai mais ter pagamento em dinheiro dentro dos ônibus. Nesse sentido, é importante que a Semob consiga garantir que todos os usuários consigam acessar seu direito ao transporte”, avaliou. “Para isso, precisa ocorrer uma melhoria significativa do funcionamento do aplicativo, além da disponibilização massiva de postos de compra e recarga de bilhetes em todas as regiões administrativas do DF”, acrescentou Max Maciel.

Correio também ouviu passageiros que utilizam os ônibus diariamente no DF. Para a copeira Suely Vidal, 58 anos, a mudança é totalmente negativa. “Tem muitas pessoas que só têm o dinheiro como forma de pagamento. Como elas vão ficar?”, questionou a moradora de Samambaia. “Tenho o cartão vale-transporte, mas não posso usar aos fins de semana, e só me sobra o dinheiro como opção”, comentou.

Enquanto isso, o estudante Danilo Simões, 23, afirmou que existe um lado bom e outro ruim na mudança. “Tirando o dinheiro dos ônibus, vai diminuir a quantidade de assaltos e até mortes de cobradores. Só que por outro lado, quem não tem outra forma de pagamento, como uma pessoa em situação de rua, vai ficar impossibilitada de andar de ônibus”, pontuou o morador do Riacho Fundo.

16 maio

Pagamento de passagem de ônibus com dinheiro começa a ser extinto no DF; entenda

A medida atinge a maioria dos ônibus do transporte público. Apesar disso, algumas linhas continuarão com o pagamento em dinheiro, com transição gradual a novos modos de pagamento

A partir de 1º de julho, não será possível pagar a passagem em dinheiro na maioria dos ônibus do Distrito Federal. A medida saiu em portaria no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) desta quinta-feira (16/5). Conforme cita o documento, assinado pela Secretaria de Mobilidade do Distrito Federal (Semob), o pagamento da passagem poderá ser feito com o cartão Mobilidade, cartões de crédito e débito, além do QR Code (via Pix). A pasta irá indicar quais linhas ainda será possível o pagamento da passagem em dinheiro.

A medida já tinha sido anunciada pelo secretário Zeno Gonçalves, em entrevista ao Correio na semana passada. À época, o secretário explicou que a mudança ocorrerá de maneira gradual. “Nós pretendemos retirar o dinheiro em espécie como forma de pagamento porque proporcionará mais segurança aos passageiros, motoristas e cobradores. Além disso, evitará filas com a questão do troco, que muitas vezes é empecilho”, disse, à reportagem. “O nosso desejo é que as pessoas fazem adesão ao cartão Mobilidade, mas também proporcionando a eles a possibilidade de utilizar cartão de débito e crédito”, explicou à reportagem, na ocasião.

Gonçalves afirmou, na ocasião, que haveria um decreto e uma portaria, com publicação até o fim de maio – o que acabou ocorrendo –, com a regulamentação do sistema. Para as pessoas aderirem à novidade, a Semob fará uma campanha educativa, onde elencará como será o processo e os benefícios de a população aderir o cartão Mobilidade. O modelo de pagamento por cartão bancário ocorre em 134 ônibus da Viação Marechal.

“Está tudo desenhado, também, com o BRT. Por enquanto, quem paga com débito e crédito, não terá direito a integração. Por isso, a campanha massiva é para que todo usuário do transporte público tenha o cartão Mobilidade. Nós vamos ampliar os pontos para as pessoas terem acesso ao cartão”, garantiu Zeno à época.

Em 8 de abril, transações por Pix bateram recorde no Brasil. De acordo com o Banco Central, foram registradas 201,6 milhões de transações em um único dia.

O recorde anterior havia sido registrado em 6 de março deste ano e era de 178,7 milhões de transações diárias. “Os números são mais uma demonstração da forte adesão de pessoas e empresas ao Pix, meio de pagamento lançado pelo BC em novembro de 2020”, disse o Banco Central, à época.